Instituto Raul Soares completa 100 anos de história como referência em saúde mental

Unidade atua como centro de pesquisa e ensino da neurologia e psiquiatria, além de contribuir diretamente para os atuais modelos de atendimento humanizado e com foco na reinserção social

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O Instituto Raul Soares (IRS), uma das unidades mais antigas da Fundação Hospitalar do Estado de Minas Gerais (Fhemig), completou 100 anos em 2022. Fundado em 7 de setembro de 1922, a unidade chega ao seu centenário com muita história para contar, já que protagonizou movimentos que contribuíram para os modelos atuais de atendimento na saúde mental, em que são priorizados os tratamentos humanizados e promovida a reinserção social daqueles que anteriormente eram segregados dentro dos sanatórios.

Fhemig / Divulgação


“O Instituto Raul Soares pertence, de forma singular, à história da própria Fhemig. Os caminhos se cruzam na busca pela assistência humanizada, pelas inovações ditadas pelos contextos sociais. Temos orgulho dessa trajetória, repleta de conquistas reconhecidas por toda população mineira. O nome da unidade hoje é sinônimo de assistência psiquiátrica de qualidade. A Fhemig acredita que essas conquistas estão longe de terminar, porque nosso foco é investir na melhoria contínua”, afirma a presidente da Fhemig, Renata Dias.

A presidente da fundação destaca, também, a busca constante por melhorias para a oferta do serviço.

“Na área de infraestrutura, as reformas estão acontecendo para assegurar um ambiente cada vez melhor aos nossos usuários. Na área assistencial, há muitos estudos e pesquisas que continuarão a acontecer para que os tratamentos sejam cada vez mais eficazes e resolutivos, capazes de dar ao usuário as condições plenas de sua reinserção social. Nada disso seria possível sem o compromisso de cada servidor do Raul Soares, que merecem também nosso reconhecimento nesta data tão especial”.

O diretor do IRS, Marco Antônio Andrade, também destaca a importância da unidade para o estado.

“Ao longo do seu percurso, a instituição foi palco de momentos históricos de transformação das ideias e dos modos de fazer no campo da saúde mental mineira. Várias gerações de psiquiatras foram aqui formados e hoje atuam por todo o estado. Nas últimas décadas, tivemos muitos avanços na assistência à saúde mental e permanecemos atentos aos novos desafios que se apresentaram, sempre nos adaptando às mudanças na rede de atenção, prestando uma assistência de qualidade, humanizada e em sintonia com os preceitos éticos e científicos”, afirma.

Um pouco de história

Inicialmente chamada de Instituto Neuropsiquiátrico, a unidade – que teve seu projeto arquitetônico inspirado no Hospital Psiquiátrico de Frankfurt, na Alemanha – pertencia à Fundação Estadual de Assistência Psiquiátrica (Feap), bem antes da criação da Fhemig, em 1977.

O Instituto ia além da assistência, sendo responsável pela formação básica de praticamente todos os psiquiatras de Minas Gerais durante alguns anos. Seu primeiro diretor empossado foi Alexandre Drummond, auxiliado pelos também médicos Galba Moss Velloso e Sylvio Cunha.

Na década de 1920, a “loucura” era tratada como uma questão de segurança pública. Porém, em 1929, a unidade implantou métodos inovadores para a época, causando espanto no cenário assistencial. Isso porque seu modelo defendia a vigilância contínua no lugar da contenção física, além da implantação de oficinas de trabalho, clinoterapia, hidroterapia e psicoterapia, que passaram a ser vistas como auxiliares no tratamento dos internos.

Em 1932, foram criados, na unidade, os serviços de cirurgia geral e especializada do sistema nervoso, entre outros, além de estabelecidas as bases de uma escola profissional para enfermeiros. Além disso, a década de 30 também foi o divisor de águas entre a conduta segregativa e a nova visão da medicina na área da psiquiatria, quando foram introduzidas modalidades terapêuticas especiais.

O primeiro ambulatório psiquiátrico foi implantado na década de 1960, para atendimento aos pacientes que recebiam alta. A iniciativa, ousada para a época, mostrou-se tão eficaz que, anos mais tarde, foi incorporada ao fluxo de assistência à saúde mental.

Na década de 1970, começaram a chegar ao Brasil as influências da reforma que se iniciava na Itália. O movimento antecipava, inclusive, as diretrizes do SUS, criado pela Constituição Federal em 1988 e regulamentado pela Lei 8080, de 1990. Humanização, equidade, universalidade e integralidade eram conceitos que já norteavam aquelas primeiras discussões que iriam transformar a história da psiquiatria no Brasil.

Nos anos 1980, acontece a separação física entre o ambulatório e o serviço de internação e a criação do pronto-socorro psiquiátrico. Em decorrência desse processo de reestruturação, foi inaugurado, em 1984, o primeiro hospital-dia da rede pública na unidade, que serviu como um recurso para aqueles que não tinham condições de tratamento ambulatorial, mas também não possuíam quadro clínico com indicação de internação.

A década de 1990 também foi marcada por significativas melhorias assistenciais na unidade, que foi ampliada e teve seu serviço de urgência remodelado, além da criação do Centro de Convivência Arthur Bispo, destinado a oficinas de criação, expressão e produção para os usuários.

Em 2005, a unidade foi credenciada pelos Ministérios da Educação e da Saúde como hospital de ensino, enquanto formador de residentes de psiquiatria, com mais de meio século de tradição. Anos depois, em 2014, o IRS criou o Programa de Residência Multiprofissional em Saúde Mental.

Fhemig / Divulgação


Lembranças 

A terapeuta ocupacional Jussara dos Santos Lopes iniciou sua trajetória no Instituto Raul Soares (IRS), em 1987, e acompanhou de perto boa parte da longa história da instituição e todas as suas mudanças. “Muita coisa melhorou: as condições de trabalho, a farmacologia e o projeto clínico assistencial do hospital. Também tivemos uma mudança muito grande no perfil dos pacientes. Antes, atendíamos neuróticos graves, psicóticos e casos de alcoolismo. Nos últimos anos, começamos a acolher também muitos usuários de outras drogas”, afirma.

Entre as muitas memórias de tantos anos de dedicação à unidade, Jussara se recorda que, na década de 90, a equipe de terapia ocupacional procurou o diretor da unidade para solicitar uma visita à cidade de Santos. “O objetivo era saber mais sobre a desospitalização de pacientes que estava acontecendo lá e conhecer os novos serviços criados. O diretor aprovou a ideia e, então, fomos com um grande grupo da comunidade hospitalar à cidade, onde permanecemos durante uma semana”, conta. A experiência rendeu um seminário interno no IRS, que culminou no primeiro centro de convivência de Minas Gerais, nomeado Arthur Bispo. “Foi uma época bem produtiva”, lembra.

Para ela, o Instituto Raul Soares tem um significado especial. “A instituição nos estimula ao aprendizado, à busca do conhecimento, à superação de desafios, pois precisamos lidar com o inesperado e acolher as demandas de cada paciente por meio da escuta. Isso nos motiva a sempre buscarmos o melhor para oferecer ao tratamento deles”, declara. “O Raul esteve sempre se reinventando, é uma instituição em movimento, em busca de saídas para oferecer um tratamento mais humanizado. Sinto prazer em trabalhar aqui e sou muito grata pela oportunidade de conhecer outros caminhos dentro do IRS, coordenando alguns serviços e participando de vários projetos, que contribuíram para o meu crescimento profissional e pessoal. Fico feliz de participar do centenário de um local tão importante para o município e, até mesmo, para o estado e o país”.

Aprendizado

A auxiliar administrativo Heloísa Helena Santos Biagini trabalha no Raul Soares desde 1981 e tem pela instituição um afeto especial, de onde guarda muitas memórias importantes. “Nossa equipe sempre foi muito unida e os pacientes tratados como parte da nossa família. Sempre tivemos muito carinho por eles, pois são pessoas muito discriminadas. Por eles ficarem livres na unidade, acabamos tendo bastante convívio e criando laços de afeto”, conta.

Para ela, conviver com pacientes da saúde mental é um grande aprendizado. “Faz com que tenhamos uma visão de vida diferente e mais empatia com o outro”, afirma a servidora que só tem elogios à unidade.

“O IRS significa muito para mim, não é à toa que estou aqui há mais de 40 anos. Temos uma unidade bem preparada, referência na área da psiquiatria. O tempo vai passando, vai mudando o perfil dos pacientes, mas o carinho pela unidade sempre continua”, afirma Heloísa.

A enfermeira Maria do Rosario Costa Villefort está na unidade há 28 anos e concorda. “É um bom lugar para trabalhar. Aqui fiz vários amigos e aprendi muito sobre a vida, a psiquiatria, e sobre meus direitos e deveres como cidadã e servidora pública”.

Nos dias de hoje

Atualmente, o Instituto Raul Soares recebe pacientes em crise, por meio do atendimento de Urgência, e também por encaminhamento de outros serviços de todo o estado, como unidades básicas de saúde e Centros de Atenção Psicossocial (Caps).

Já na admissão, a equipe oferece acolhimento ao paciente e inicia a elaboração de um plano individual terapêutico – que não somente inclui os diagnósticos psiquiátricos, mas contempla ainda o estado geral clínico do paciente, bem como sua situação social.

A unidade integra e segue os fluxos estabelecidos pela rede de saúde mental em consonância com a integralidade da assistência. O caráter vanguardista e propositivo dos profissionais que fazem parte da história do Instituto Raul Soares o tornou referência de acolhimento breve e resolutivo para garantir que os pacientes tenham a chance de se restabelecer enquanto indivíduos, integrando suas famílias e a sociedade com harmonia e perspectivas melhores.

 

*Este conteúdo foi produzido durante o período de restrição eleitoral e publicado somente após a oficialização do término das eleições.



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