Pesquisa financiada pela Fapemig desenvolve tratamento promissor para a nutrição de lavouras 

Inovador, projeto baseado na reutilização de águas residuárias na agricultura gera economia sem danos ao meio ambiente

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A busca por soluções que minimizem impactos ao meio ambiente é uma vertente de fomento a pesquisas da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Minas Gerais (Fapemig). Apoiado nisso, o engenheiro agrônomo e pesquisador Enio de Souza, coordenador do curso de Agronomia da Universidade Federal de Uberlândia (UFU), desenvolveu método de tratamento de águas residuárias da agricultura utilizando o subproduto da indústria cerâmica.

O projeto é alinhado ao objetivo do Dia Mundial do Meio Ambiente, celebrado nesta segunda-feira (5/6), que incentiva ações de desenvolvimento sustentável. 

Por meio do método desenvolvido, há ganhos econômicos e ambientais nos processos de produção agrícola e industrial. 

Impacto 

A água residuária do café é tóxica e necessita de tratamento adequado para ser reutilizada. Assim como outros rejeitos, quando descartada em barragens traz inúmeros prejuízos socioambientais. 

Enio de Souza conta que, além disso, por conter restos orgânicos dos grãos e nutrientes, quando armazenada, possui um forte odor. 

O método proposto apresenta tratamentos químico e físico capazes de filtrar o líquido, conservando e elevando alguns nutrientes benéficos para lavouras.

A proposta une o subproduto das duas áreas distintas: as águas residuárias da cafeicultura e o subproduto da indústria de cerâmica. 

De acordo com o agrônomo, a ideia surgiu ainda na graduação, a partir de uma inquietação acerca da quantidade de resíduos depositados no meio ambiente. Na época, estudando na Universidade Federal de Lavras (Ufla), orientado pelo professor Luiz Roberto Guimarães Guilherme, ele trabalhou com a lama vermelha e a lama oriunda da mineração de ferro.

Objetivo

O pesquisador lembra que já era um objetivo evitar o depósito de rejeito em barragens e reutilizar alguns elementos químicos presentes no minério para a agricultura. 

A ideia persistiu e, após passar em concurso na UFU, ele descobriu a indústria de cerâmicas em uma região referência na cafeicultura. “Isso me chamou atenção porque eu teria um resíduo capaz de se tornar um ótimo adsorvente [filtro] que estava sendo descartado. Pensamos em dar um fim mais nobre a esse material, para ele ser reutilizado de forma mais racional e até rentável para a indústria”, conta. 

O tratamento começa com a aplicação de compostos químicos que separam alguns particulados orgânicos em suspensão e mantendo nutrientes como potássio, muito exigido pela planta. 

Nessa etapa, o tratamento também possibilita adição de outros nutrientes, como cálcio e magnésio, que ficam retidos em pequenas quantidades durante o processo de filtragem. Após a primeira separação, a água passa pela coluna de subprodutos da cerâmica, quando é gerado o líquido adequado para reutilização.

Resultados promissores 

Durante o processo, o agrônomo conta que a análise da água residuária mostrou-se surpreendente devido à quantidade de nutrientes encontrados, sobretudo o potássio. 

Além dele, destacam-se fósforo, nitrogênio e componentes orgânicos (casca e polpa do café) extremamente importantes para a fertilização do campo. “A ideia era utilizar o subproduto da cerâmica para filtrar esta água e ela retornar à lavoura”, explica Souza. 

Ele ainda destaca que, em pesquisa secundária, foi analisada a aplicação da água tratada no solo. Após a utilização, percebeu-se que a lixiviação de potássio no solo foi menor, quando comparado à movimentação do nutriente adicionado via água tratada em relação a alguns fertilizantes convencionais. 

Isso significa que a infiltração das substâncias na terra até o encontro com os lençóis freáticos mostrou-se menor quando comparado aos fertilizantes industriais.

A iniciativa promissora tem pedido de proteção intelectual e, agora, foca na expansão da pesquisa e na realização de experimentos em grande escala.

“Nós estamos com o desafio de testar o projeto em escala maior para que possamos atender às propriedades da região. Já fizemos o contato com alguns produtores e cooperativas. Existe um desejo de trabalhar junto, mas ele ainda não foi consolidado”. 

Souza também conta que está em contato com indústrias da região com o objetivo de produzir um processo mecânico para a primeira parte da filtragem separar os rejeitos mais densos.

Sustentabilidade e economia

Questionado sobre viabilidade e custo do processo, o pesquisador afirma que o foco deve ir além do aspecto econômico e deve considerar, também, questões ambientais, como deixar de descartar rejeitos em barragens. 

“Nós temos que levar em conta o valor econômico para tornar a atividade atrativa para o produtor, mas existe também todo um custo ambiental. Quando você constrói uma barragem na sua propriedade, há um estigma negativo por causa do mau cheiro, além da possibilidade dela se romper ou transbordar. Então, há benefício em se reutilizar aquela água e, com o tratamento, devolver o potássio para a lavoura. Não é algo que vai isentar a compra de fertilizantes, mas diminui a quantidade. Além disso, há o marketing positivo de mostrar e garantir a sustentabilidade da lavoura”, destaca. 

O pesquisador avalia perspectivas futuras, como adicionar ainda mais nutrientes na água tratada de forma a utilizá-la como veiculadora de outros substâncias e até microrganismos benéficos para a lavoura. 

São ideias promissoras quando comparadas a projetos similares já colocados em prática. “A adição de microrganismos no solo torna os nutrientes mais disponíveis e  torna o tratamento mais atrativo para produtores”, exemplifica. 



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